O Videota

Somos todos videotas

Ricardo Calil

O nome deste blog foi tirado da curiosa tradução para o português de “Being There”, livro de Jerzy Kosinski lançado em 1970. No Brasil, “O Videota” é mais conhecido por sua adaptação ao cinema, “Muito Além do Jardim” (1979), de Hal Ashby. No filme, Peter Sellers interpreta Chance, homem ingênuo que passou a vida dentro dos limites da casa de seu patrão cuidando do jardim e vendo televisão. Quando finalmente sai ao mundo, é reverenciado como um gênio – e as platitudes que diz, inspiradas no “lixo cultural” da TV, são consideradas metáforas brilhantes.

being there

Assim como Chance, tanto o livro de Kosinski (autor polonês naturalizado norte-americano que se matou em 1991 depois de ser acusado de plágio por outro livro) quanto o filme de Ashby são superestimados. Há algo de datado na sua crítica à televisão como um instrumento idiotizante (sobretudo em uma época em que ver certas séries de TV virou símbolo de status social, como antes acontecia com o cinema de arte). Mas é preciso reconhecer que ninguém interpreta um paspalho no cinema como Peter Sellers (vide “O Convidado Trapalhão”, a série “A Pantera Cor de Rosa”, “Dr. Fantástico” etc).

Então, por que dar o título de uma estranha tradução de um livro menor para este blog? Porque é sonoro, claro. Mas sobretudo porque há algo de significativo – e, nesse caso, também atual – na ideia de pessoas que formam parte de sua visão de mundo e educação audiovisual assistindo a vídeos virais em pequenas telas (agora ainda menores que a da TV). Sem perceber, todos estamos fazendo cara de Peter Sellers diante da telinha – seja a do tablet, sozinhos na cama; seja a do celular no ônibus lotado; seja a do computador, disfarçadamente, no meio do expediente.

Se gastamos um tempo inestimável de nossas vidas com vídeos virais, por que não levá-los minimamente a sério? Neste blog, vamos falar – com atenção, carinho e respeito – de vídeos de gatos fofos, crianças sem noção, dublagens irritantes, flagrantes de abusos policiais, covers diversos de música e assim por diante. Daremos preferência a material caseiro, modesto e de procedência duvidosa. Mas, de tempos em tempos, poderemos falar também de clipes, trailers, cenas de novela, campanhas emocionantes e mal-intencionadas de marketing etc.

O que o gosto (ou o vício) por esses fragmentos audiovisuais diz sobre nós? Eles representam a democratização do audiovisual ou uma modernização do ópio do povo? São cinema ou lixo cultural? E, se são cinema, eles podem ser analisados de acordo com seus gêneros, sua narrativa e linguagem? Estamos fadados a espasmos de atenção de no máximo 3 minutos? E o cinema tal como o conhecemos nos últimos 120 anos, com suas produções caras e sua experiência coletiva de longuíssimas duas horas, vai virar o beletrismo da imagem? Ainda vamos sentir saudades dos bons e velhos tempos em que as famílias se reuniam diante da televisão para ver o “Jornal Nacional”, “Chaves” ou “Pânico na TV”? A vida imita a arte ou, como diz Woody Allen, imita programas ruins de TV? A videocassetada é o formato essencial do audiovisual contemporâneo?

Estas são algumas das questões que este blog irá levantar – sem necessariamente responder. Comentários publicáveis, sugestões de vídeos, compartilhamentos nas redes sociais serão sempre bem-vindos.

Muito prazer,

O Videota.